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Empresa não precisa apresentar garantia para débito parcelado

Em decisão inédita, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou pedido da Fazenda Nacional para impedir a distribuição de lucros e dividendos aos sócios de uma empresa de Santa Catarina. A União buscava uma garantia para o pagamento de débitos inscritos em um programa de parcelamento ordinário da Receita Federal.

Como não havia apresentado garantia para uma dívida de R$ 577 mil em Imposto de Renda (IR), PIS, Cofins e IPI, a empresa foi alertada por seu contador de que poderia ser multada se fizesse a distribuição de lucros e dividendos. Com isso, decidiu entrar com mandado de segurança preventivo na Justiça. O argumento apresentado foi de que o pagamento da dívida já estava automaticamente garantido com a adesão ao programa de parcelamento, realizada em 2005. 

 A empresa obteve decisões favoráveis nas duas primeiras instâncias. A Fazenda Nacional decidiu, então, levar o caso ao STJ, sustentando que, apesar de suspender a cobrança do débito, o parcelamento não garantiria o pagamento. Dessa forma, defendia que a empresa pagasse uma multa de 50% sobre o valor distribuído aos sócios, prevista em lei editada durante o regime militar. 

 Ainda em vigor, a Lei nº 4.357, de 1964, proíbe empresas limitadas de distribuir lucro e as empresas anônimas de pagar bonificações aos sócios e acionistas se possuírem débitos fiscais ou previdenciários não garantidos. Em caso de descumprimento, prevê aplicação de multa de 50% sobre o valor da remuneração paga. 

 O argumento, no entanto, não convenceu os ministros da 2º Turma. O relator do caso, ministro Castro Meira, considerou que o parcelamento já garantiria a dívida. Isso porque a adesão implica confissão da dívida, além de suspender a exigência do crédito. Dessa forma, disse, não haveria motivos para impedir a distribuição dos lucros e dividendos. \"Havendo pagamento regular das parcelas, o contribuinte está em situação de regularidade com a Receita Federal\", afirma na decisão. 

 Castro Meira ainda considerou que muitos parcelamentos se estendem por anos. Dessa maneira, afirmou, impedir o pagamento das remunerações \"atenta contra a própria razão de existir das pessoas jurídicas, que é a de permitir a divisão da riqueza gerada entre sócios e acionistas\". 

 Para o advogado da empresa, João Carlos Cassuli, o cenário desenhado pela Fazenda \"esvaziaria\" o parcelamento. \"Haveria ao mesmo tempo aplicação de multa e exigência de garantia\", diz, acrescentando que, em primeira instância, o juiz decidiu que não bastaria ter a certidão negativa de débitos para comprovar a regularidade fiscal. \"Isso porque o documento tem validade de seis meses.\" 

 Embora não seja uma situação recorrente, advogados afirmam que pedir a suspensão da distribuição de lucros e dividendos é uma medida adotada pela Fazenda para evitar que contribuintes tornem-se inadimplentes de programas de parcelamento. \"Seria uma dupla garantia. A Fazenda quer se adiantar a uma eventual falta de pagamento\", diz Glaucia Maria Lauletta Frascino, sócia do Mattos Filho Advogados. Para Alessandra Craveiro, sócia do Guerra, Doin e Craveiro Advogados, o pedido de adesão, a confissão do débito e o pagamento regular já dão segurança à Fazenda. 

 No julgamento, os ministros da 2ª Turma levantaram outro argumento - considerado de extrema importância por advogados - para negar a tese do Fisco: o de que a garantia não precisa ser apenas \"física\", ou seja, com penhora ou depósito judicial. Para Castro Meira, \"embora não se assemelhe ao depósito ou à penhora\", o parcelamento fiscal garante o crédito tributário de outra forma, \"pois constitui confissão irretratável de dívida e renúncia ao direito sobre o qual se funda ação\". 

 Para Julio Augusto Alves de Oliveira, do Siqueira Castro Advogados, o precedente é importante para definir o conceito de \"débito não garantido\" e incentivar uma mudança na lei de 1964. \"O termo é muito amplo e gera insegurança por conta do generalismo\", diz. Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) preferiu não se pronunciar.

 

Fonte: Valor Econômico - 17/05/2012